PGBR NA MÍDIA
MPT propõe licença parental compartilhada
Proposta encaminhada à Procuradoria-Geral da República é dividir o período de 180 dias entre pai e mãe – MATEUS BRUXEL/ARQUIVO/JC
Por Gabriela Porto Alegre
Aos poucos, as empresas brasileiras estão aderindo à opção de licença- paternidade estendida. Atualmente, o prazo de 20 dias é oferecido por 29% das companhias brasileiras analisadas pela Mercer Marsh Benefícios consultoria. Os 20 dias, e não cinco, como determina a lei trabalhista nacional, são disponibilizados por empresas que se inscreveram no programa Empresa Cidadã, criado pela Lei nº 11.770/2008, em troca de abatimentos em impostos federais. Outra alternativa é a proposta de licença parental compartilhada entre pai e mãe, recentemente encaminhada à Procuradoria-Geral da República (PGR), pelo procurador-geral do Ministério
Público do Trabalho (MPT) Rogério Fleury. A proposta, no entanto, se aprovada, valerá, inicialmente, apenas para funcionários do Ministério Público da União (MPU).
Atualmente, as mães têm pelo menos 120 dias de licença-maternidade no setor privado, podendo chegar a 180 dias se for funcionária de empresa cadastrada no programa Empresa Cidadã. O pai, por sua vez, tem direito a cinco dias, podendo chegar a, no máximo, 20, em caso de empresa também cadastrada no programa.
A proposta do MPT diz que, caso pai e mãe sejam funcionários do MPU, seria permitido que, nos últimos 60 dias de licença-maternidade de 180 dias, o pai assumisse o cuidado da criança e a mãe retornasse ao trabalho. Os 120 dias iniciais, garantidos pela Constituição, continuariam como benefício assegurado à mãe.
A proposta inclui, ainda, casais adotantes e homoafetivos. Se tiver parecer positivo da PGR, a iniciativa deverá tramitar pelo Congresso Nacional antes de entrar em vigor. A ideia é que, posteriormente, a proposta seja estendida para toda a sociedade, em órgãos públicos e empresas privadas.
Mudança poderá contribuir para diminuir a discriminação das mulheres no mercado de trabalho
A advogada trabalhista Bruna Pravatto avalia a licença parental como uma alternativa positiva, uma vez que as mudanças na legislação contribuiriam, em tese, para a mudança dos costumes da sociedade, principalmente no que diz respeito ao papel da mulher no mercado de trabalho. “Nos últimos anos, notamos uma evolução no mercado de trabalho, que passou a contar com uma expressiva quantidade de mulheres, sendo que elas, muitas vezes, são a principal fonte de renda da casa”, disse. “Por esse motivo, um ponto importante que avalio é que essa mudança contribuiria com a diminuição da discriminação das mulheres, inclusive no que diz respeito à desigualdade salarial”, completou.
Conforme Bruna, a legislação atual ainda favorece o entendimento de que os cuidados da criança devem ficar sob responsabilidade exclusiva da mãe, assim é dado a ela o direito de se afastar do trabalho nesse período. “A mudança da legislação poderia trazer impactos até mesmo culturais, alterando essa visão e reforçando a ideia de responsabilidade conjunta em relação ao cuidado com os filhos.”
O entendimento da advogada é positivo não apenas para as questões de diminuição de discriminação no mercado de trabalho, mas também por proporcionar um convívio maior dos pais com os filhos. “O benefício possibilitaria aumentar o convívio paterno com a criança, podendo, inclusive, reforçar esse vínculo que, naturalmente, é maior com a mulher em razão da própria gestação e da amamentação”, salientou.
Proposta pode ajudar a mudar senso comum de que cuidar dos filhos é responsabilidade da mulher
A proposta de licença parental compartilhada, para a advogada trabalhista Luana Pereira, representa um avanço na direção da equidade de gênero. A medida, segundo ela, faria bem não somente às crianças, mas também às mães e aos pais, que poderiam aproveitar com mais tranquilidade e afeto o momento, seja de nascimento ou adoção de uma criança. “Toda adaptação e atenção nesses primeiros momentos deve ser dividida”, defendeu. “Após o parto, a mãe e a criança necessitam de um tempo mais expressivo para a amamentação. A mãe também precisa de tempo para sua recuperação durante e após o puerpério, período no qual mudanças físicas e psicológicas são vividas pelas mulheres.”
Conforme Luana, a proposta é positiva em relação às atuais políticas trabalhistas. “Há muita discriminação de gênero contra mulheres no mercado de trabalho, e, embora a lei garanta estabilidade à gestante, na prática, muitas mulheres são demitidas ao fim do período de estabilidade ou perdem cargos de chefia em razão do afastamento prolongado”, salientou.
“Nesse sentido, o exercício da parentalidade compartilhada poderia contrapor o senso comum de que o cuidado dos filhos é responsabilidade da mulher.”
Segundo Luana, seria necessário uma mudança cultural na sociedade, que contribuísse também para um ambiente de trabalho mais acolhedor, diverso, igual, produtivo e inovador. Em outras palavras, essa opção ajudaria a afastar as mulheres de jornadas duplas ou triplas. “Precisaríamos de uma mudança cultural, deixando para trás o ideário de que somente a mulher é a responsável pela casa e pelos filhos”, defendeu. “A proposta também reforçaria a necessidade de conscientização dos próprios homens sobre o papel deles no exercício da paternidade, até porque, socialmente, eles ainda não são incentivados a vivenciarem a paternidade da mesma forma como as mulheres são desde cedo.”
Nesse sentido, Luana exemplifica a situação através de estereótipos criados pela própria sociedade. “Os principais presentes para as meninas ainda são bonecas. Bonecas de brinquedo para meninos, infelizmente, ainda são um tabu”, disse a advogada. “Não basta pensarmos quais mudanças legislativas seriam importantes. Precisamos pensar mudanças culturais que, de fato, possam gerar uma igualdade de gênero estrutural”, finalizou.