PGBR NA MÍDIA
Justiça garante créditos de PIS/Cofins sobre gastos com shopping virtual
Decisão judicial considera como insumo a taxa paga por comerciante a marketplace
Por Adriana Aguiar — De São Paulo
27/08/2021
Eduardo Ramos Viçoso Silva: “Hoje em dia esse gasto é muito significativo. É a maior despesa que essas empresas têm” — Foto: Divulgação
Comerciantes passaram a recorrer à Justiça para obter créditos de PIS e Cofins sobre gastos com as taxas cobradas pelos marketplaces – plataformas on-line, como Mercado Livre, Amazon e Magazine Luiza, que vendem produtos de terceiros. A primeira liminar que se tem notícia foi concedida pela 22ª Vara Cível Federal de São Paulo e beneficia uma empresa de equipamentos eletrônicos, que garante hoje 83% do faturamento por meio desses shoppings virtuais.
Com a pandemia, muitos comerciantes não tiveram outra opção senão recorrer aos marketplaces, que ganharam volume. Os cinco maiores do país – Mercado Livre, Magazine Luiza, Americanas, Via Varejo e Carrefour – somaram R$ 123,9 bilhões em vendas em 2020, 81% a mais que em 2019, segundo a Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo.
A tese é mais uma fundamentada na decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em recurso repetitivo (REsp 1221170), que considera insumo e, portanto, apto a gerar crédito, tudo que for imprescindível para o desenvolvimento da atividade econômica. O julgamento foi realizado em 2018.
A análise deve ser feita caso a caso, por depender de provas. No caso da empresa que comercializa equipamentos eletrônicos, o advogado Eduardo Ramos Viçoso Silva, do Peluso, Stupp e Guaritá Advogados, alegou que, em razão da pandemia, o faturamento do cliente, antes concentrado nas lojas físicas, migrou para o ambiente virtual.
“No ambiente virtual de negócios, contudo, dificilmente o pequeno ou médio player terão visibilidade em site próprio. A alternativa é socorrer-se aos denominados marketplaces”, diz o advogado. Ele acrescenta que hoje esses shopping centers virtuais são essenciais para os negócios dos comerciantes e, por isso, as comissões cobradas para intermediação – em média de 10% – devem gerar créditos de PIS e Cofins.
Ao analisar o caso, o juiz José Henrique Prescendo, da 22ª Vara Cível Federal de São Paulo, levou em consideração que o contribuinte deixa claro no pedido que, mesmo atuando com lojas físicas, necessita estar no sistema de marketplace para ter visibilidade no mercado. “De modo que possui elevados custos a título de intermediação, que conforme já asseverado, são essenciais para o regular desenvolvimento de suas atividades”, afirma.
De acordo com o magistrado, a legislação que trata do PIS e da Cofins “trouxe uma noção do que se deve compreender por insumo, a partir de um rol exemplificativo, ou seja, não taxativo” e que é preciso analisar a atividade exercida pelo contribuinte, “de maneira que o que é insumo para um contribuinte pode não ser para outro”.
No caso, a empresa tem como objeto social a fabricação de equipamentos de informática, o comércio de equipamentos eletrônicos e a prestação de serviços de manutenção. Em 2020, segundo o processo, as vendas on-line, via marketplace, corresponderam a 72% de seu faturamento.
Para o advogado Eduardo Ramos Viçoso Silva, a decisão é muito relevante economicamente e serve de precedente para outros comerciantes “Hoje em dia esse gasto é muito significativo. É a maior despesa que essas empresas têm, como se fosse o aluguel das lojas físicas”, diz.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou que vai recorrer da decisão. No entendimento dos procuradores, ela está em descompasso com o julgamento dos Temas 779 e 780, do STJ, que fixou que o conceito de insumos, para fins de creditamento de PIS/Cofins, deve ser aferido à luz da essencialidade.
Outros comerciantes não obtiveram liminares na Justiça Federal. Uma das decisões desfavoráveis foi dada em processo ajuizado por um comércio de autopeças. O caso foi analisado pela 1ª Vara Federal de Bauru (SP). O juiz federal Joaquim Alves Pinto não considerou essenciais os gastos com marketplaces. Para ele, a empresa “fez sua opção de negócio de forma a não se utilizar de espaços físicos, cortando custos como aluguel, água, luz, telefone etc. E já se beneficia com isso” (processo nº 5001921-83.2020.4.03.6111).
O outro caso envolve um comércio eletrônico de móveis em madeira. O pedido foi negado pela 2ª Vara Federal de Curitiba (processo nº 5037757-76.2019.4.04.7000). O juiz Joaquim Euripedes Alves Pinto destaca na decisão que o próprio objeto social da empresa diz que trata-se de comércio varejista por meio eletrônico, o que faz com que esses gastos sejam caracterizados como custos operacionais e não como insumos.
Leonardo Mazzillo, do W Faria Advogados, porém, considera correto o entendimento da 22ª Vara Cível Federal de São Paulo, que deu direito ao crédito. “A decisão supera definitivamente a posição equivocada da Receita Federal de que o conceito de insumos não se aplica a atividades comerciais”, diz ele. “Com exceção das grandes redes, quem quer vender produtos hoje pela internet depende necessariamente de um marketplace.”
Ao analisar a “essencialidade”, o advogado Rafael Fabiano, do Leonardo Naves Direito, ressalta que não é mais possível pensar em um mundo sem vendas pela internet. “Todas as despesas que viabilizam a venda por esse canal tornam-se, invariavelmente, essenciais e relevantes, eis que sem aquelas, a venda virtual não seria possível e, consequentemente, parte substancial da receita não se realizaria”, afirma.
Procurada pelo Valor, a Amazon não quis se manifestar sobre o assunto. Os demais marketplaces não deram retorno até o fechamento da edição.