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PGBR NA MÍDIA

23 de abril de 2025

Brasil não firmou acordo com chineses para compra de terras produtoras de milho e soja no País

Estatal da China manifestou interesse em adquirir propriedades rurais, em tratativa com entidade que não é vinculada ao governo federal; legislação brasileira impõe restrições à aquisição de terras por estrangeiros

Foto: Reprodução/Instagram

Por Bernardo Costa

O que estão compartilhando: que o Brasil teria firmado um acordo com uma estatal da China, que prevê a aquisição de terras brasileiras pelos chineses para produção de milho soja. As alegações afirmam que “nossos governantes” estão entregando as riquezas brasileiras aos estrangeiros. 

O Estadão Verifica apurou e concluiu: é enganoso. A postagem se refere a um acordo de cooperação entre a estatal chinesa Hulunbuir State Farm Group e a Sociedade Nacional de Agricultura (SNA). Como parte do acordo, a SNA presta orientação à empresa sobre as possibilidades de aquisição ou arrendamento de terras no Brasil. A SNA não é um órgão do governo federal.

A legislação brasileira restringe a aquisição ou arrendamento de terras por estrangeiros. Há limites territoriais estipulados para cada município e tamanho das propriedades. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra)é o órgão responsável por analisar as solicitações. Segundo o órgão, não há requerimentos da Hulunbuir State Farm Group protocolados junto ao órgão.

Saiba mais: a postagem compartilha notícia publicada no site da SNA, em 13 de março, sobre um acordo de cooperação firmado entre a instituição e a estatal chinesa Hulunbuir State Farm Group, que é ligada à produção agrícola e está sediada na cidade de Hulunbuir, na região da Mongólia Interior, na China.

No acordo, segundo divulgado pela SNA, a estatal chinesa vai colaborar com fazendas ou empresas brasileiras. O objetivo é melhorar a produtividade de milho para o alcance de benefícios mútuos, por meio do intercâmbio tecnológico, partilha de recursos e investigação e desenvolvimento conjuntos.

Como consta no site da SNA, a estatal chinesa manifestou a intenção de compra ou aluguel de terras no Brasil que estejam disponíveis e aptas para o plantio de milho e soja. Ao Verifica, o vice-presidente da SNA, Hélio Sirimarco, explicou que a entidade está orientando a estatal sobre como funciona a legislação brasileira para aquisição ou arrendamento de terras por empresas estrangeiras.

“Há uma série de restrições, não é algo comum”, disse. “Nós estamos explicando a eles como funciona, quais são as possibilidades e os problemas legais que os estrangeiros encontram para adquirir terras no Brasil”.

A SNA é uma entidade fundada em 1897 no Rio de Janeiro, e não tem vinculação com o governo federal.

Legislação restringe aquisição de terras por estrangeiros

A legislação brasileira restringe a aquisição de terras por pessoas ou empresas estrangeiras ou empresas brasileiras com controle societário de estrangeiros. As determinações constam na Lei 5.709, de 7 de outubro de 1971, que foi regulamentada pelo Decreto 74.965, de 26 de novembro de 1974.

De uma forma geral, somente podem adquirir terras no Brasil pessoas estrangeiras com residência fixa no País ou empresas estrangeiras autorizadas a funcionar no País. E há limites territoriais: a soma das áreas rurais pertencentes a pessoas estrangeiras, físicas ou jurídicas, não pode ultrapassar um quarto da superfície dos municípios onde se situem.

Segundo a advogada especialista em questões fundiárias Natasha Giffoni Ferreira, estrangeiros da mesma nacionalidade não podem deter mais do que 10% da área total de um município

O Parecer AGU/LA-01/2010, da Advocacia-Geral da União (AGU), equiparou empresas brasileiras com capital estrangeiro majoritário a pessoas jurídicas estrangeiras no que se refere às restrições estabelecidas na Lei 5.709/1971.

No caso de arrendamento de terras por estrangeiros, o artigo 23 da Lei 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, impôs as mesmas restrições estabelecidas para o caso de aquisições de terras que constam na Lei 5.709/1971.

Há, ainda, outras restrições, em relação a áreas situadas em faixas de fronteira ou quando o somatório de áreas arrendadas ou adquiridas excedem 50 MEI no caso de pessoa física, ou 100 MEI no caso de pessoa jurídica. O MEI (Módulo de Exploração Indefinida) é uma unidade de medida em hectares com valor fixado pelo Incra para cada município.

Nesses casos, segundo o artigo 29 da Instrução Normativa nº 88, de 2017, do Incra, as autorizações devem ser concedidas pelo Presidente da República, ouvido o Conselho de Segurança Nacional, ou pelo Congresso Nacional.

Aquisições ou arrendamentos são controlados pelo Incra

Tanto em casos de aquisição ou arredamento de terras por estrangeiros, a autorização deve ser concedida pelo Incra.

Na avaliação da advogada Natasha Giffoni Ferreira, nada indica que deva haver alguma preocupação na busca de terras brasileiras pela estatal chinesa.

“Nós temos leis que protegem a terra brasileira e trazem uma série de restrições para aquisição ou arrendamento por estrangeiros”, disse Natasha. “São leis conhecidas, antigas, e nada indica que elas não serão cumpridas”.

Segundo o advogado Manuel Cruvinel Borges, especialista em Direito do Agronegócio, na prática, os processos de aquisição ou arrendamento de terras por estrangeiros no Brasil não são aprovados.

“Nunca se conseguiu isso na prática, devida à falta de uma regulamentação do Incra sobre como efetivamente obter essa autorização, com definições como prazos para análises e esclarecimentos sobre os órgãos envolvidos”, explicou. “Há uma falta de vontade nesse sentido. As poucas iniciativas de que tivemos notícia não saíram da gaveta”.

https://www.estadao.com.br/estadao-verifica/china-compra-de-terras-brasil-agricultura-milho-soja/